domingo, 30 de setembro de 2007

Um colega de Benavente

Maria Filomena Mónica, cronista do Público, há muito tempo que debate em público questões comezinhas da nossa vida social, como por exemplo a da Educação.

É licenciada em Filosofia; doutorada em Sociologia por Oxford e tem escrito livros, diversos sobre fenómenos sociológicos e sobre a Educação em Portugal. Desde 1978, com Educação e Sociedade no Portugal de Salazar, até Os Filhos de Rousseau, dez anos depois, tem um percurso de escrítica do sistema de ensino que os governantes nos impingem, desde há trinta anos a esta parte.

Não é a única pessoa, com notoriedade pública, a escrever contra a corrente deste sistema de ensino e há outros exemplos como o de Nuno Crato.

Em 28 de Fevereiro de 1997, escreveu um artigo na revista Vida do extinto Independente, com o título A Catástrofe, referido aos programas e exames do 12º ano de então que lhe pareciam “o lugar ideal para se detectar o pensamento do legislador”. “ A ingestão de doses exageradas de Baudrillard, Bourdieu e Baudelot levou os pedagogos do Ministério a perder a cabeça. Diferentemente de Marx, um pensador que sabia escrever, os dedagogos de esquerda refugiam-se num limbo retórico, em que nada tem significado”.

No número anterior da mesma revista, em 14 de Fevereiro, passava a limpo a ideia de comparar os exames de Português e História, de 1960 e 1996. Foi nesse ano que pela primeira vez, desde a Reforma de 1986, havia exames para os que tinham passado os estudos secundários, sem eles. Foi uma catástrofe.

Estava então no Governo “uma equipa que fez da Educação a sua paixão. Este arrebatamento do PS ainda não levou a nada. Mas o principal responsável pelo deplorável estado das escolas é o PSD, que domina os destinos do sector nos últimos 17 anos ( desde 1980). Este partido, supostamente de direita, importou todas as modas pedagógicas de esquerda. Em matéria de Educação a direita não pensa e a Esquerda diz disparates."

O cenário é desolador. Rodeado de pedagogos, os sucessivos ministros, quase todos engenheiros, planearam a educação dos nossos filhos como se de betão armado se tratasse. Governos de sinal oposto limitaram-se a aplicar a receita cozinhada nas escolas de Ciências da Educação. As opções políticas desapareceram de cena.”

Estes dois artigos de Filomena Mónica, publicados no suplemento Vida do extinto Independente, de Fevereiro de 1997, valem a pena ser lidos, porque o panorama actual do ensino, não melhorou substancialmente, no que se refere à filosofia do sistema.

Hoje, no Público, o artigo é dedicado a um desses pedagogos de formação, provavelmente símbolo deste ensino e sistema educativo que vamos tendo nestas últimas décadas e provavelmente o responsável maior pelo descalabro a que vamos assistindo, nos diversos campos de relevo político-social.

Valter Lemos é o nome. Secretário de Estado, a função. Biólogo, especializado em Ciências de Educação, o estatuto.

Filomena Mónica, escreve que nunca se viu o indivíduo em debates parlamentares, ou sequer a expor e demonstrar publicamente que tem uma ideia sobre a Educação. E no entanto, detém competências enormes sobre o ensino básico e secundário.

Intrigada com o personagem FM foi investigar e descobriu que tem 51 anos, é de Penamacor, formado em Biologia e com um mestrado em Ciências da Educação passado pela Boston University. No regresso desse mestrado, foi professor do ensino secundário, de onde passou a formador de professores, a consultor de “projectos e missões do Ministério da Educação” e entre 1985 e 1990, a professor adjunto da Escola Superior do Instituto Politécnico de Castelo Branco.

Desde meados dos noventa que o recheio curricular disparou: hoje é professor-coordenador, depois de ter sido presidente do conselho científico da sua escola, o que na ausência de qualificação académica superior, leva FM alvitrar que só o destino político ou administrativo o justifica.

Desde 2005, assenta no Governo, numa Secretaria de Estado, depois de ter sido deputado, entre 2002 e esse ano, como independente, nas listas do PS. Parece que a independência o impedia de exercer o cargo, porque nunca lá pôs os pés, preferindo a presidência de um Politécnico e à presidência de uma Assembleia Municipal.

Perante este percurso afinal de contas vulgar e comum a tantos outros que assentam na política, FM, pretende ir mais além para entender o que pensará esta personagem, não só da Educação mas do mundo que o rodeia. E tem um ponto de referência: um livro de 1986, já com seis edições e manual presumido de muitos cursos de Ciências de Educação. O título é um programa: O Critério do Sucesso: Técnicas de Avaliação e Aprendizagem.

Em seguida, FM lança-se em meia dúzia de parágrafos, à análise perfunctória, mas seguramente deprimente, do conteúdo do manual, para concluir o seguinte:

O que sobressai deste arrazoado é a convicção de que os professores deveriam ser meros autómatos destinados a aplicar regras. Com responsáveis destes à frente do Ministério da Educação, não admira que, em Portugal a taxa de insucesso escolar seja a mais elevada da Europa. Valter Lemos, reúne o pior de três mundos: o universo dos pedagogos que, provindo das chamadas ciências exactas, não têm uma ideia do que sejam as humanidades; e o mundo totalitário criado pelas Ciências da Educação e a nomenklatura tecnocrática que rodeia o primeiro-ministro.”

3 comentários:

Fernando Martins disse...

Caro José:

Já tinha sido alertado para o texto de MFM, que gostava de ler. Não me sabe dizer se alguém o publicou?

josé disse...

Não vi publicado, mas a essência do escrito é essa que aí deixei.
O resto, é uma análise do português escrito pelo especialista em Ciências de Educação e particularmente às vírgulas do texto. COm um pormenor delicioso: MFM critica duas ou três passagens por causa de vírgulas mal colocadas, mas no seu próprio texto, tal gato também aparece...

Fernando Martins disse...

Já encontrei - em:
http://educar.wordpress.com/2007/09/30/maria-filomena-monica-sobre-valter-lemos/
Um bom Blog sobre educação - A Educação do meu Umbigo.